Alguma coisa sobre tamareiras
Alguma coisa sobre tamareiras
Parece que fazer algo com as mãos me acalma, senti uma sensação boa agora tentando arrumar as folhas desse caderno. Estava ansiosa, tensa, ainda sinto a tensão nos ombros. Ansiosa, como se o ar quisesse sair da minha boca, mas ao invés de sair só entrasse pensamentos e tudo que o tenho e o que quero fazer não coubesse, olho o tempo, as horas no celular e sou invadida por mais informações e pensamentos que só entram e não saem, fico sufocada de nada, apertada pelo vazio que se expande.
Pego o caderno, começo a mexer em cada aspiral, afrouxando um por um com meus dedos, abro espaço para as folhas que teimam em virar a página. E sem me dar conta respiro melhor, sem ter que pensar na dificuldade do que tenho que fazer. Volto ao presente, volto a mim. A imagem da minha “batian” me vem a cabeça, era uma rotina constante que ela mantinha – dobrava todas as embalagens de pão (as de saco de papel, as sacolas de plástico e as embalagens de pão de sanduiche), todas as embalagens, não sei o que fazia, guardava, reciclava, talvez jogasse fora, um ritual diário de estar presente.
Escrever é um ritual diário, será que me senti assim por não escrever? Não, acho que antes nem sentia que sentia. As vezes sinto o aperto, à noite, no meu coração e sei que é algo relacionado a ansiedade. Tenho pressa de algo que ainda não sei, quero alguma coisa, sei que tenho que esperar, mas meu corpo sente esse querer e não entende que precisa esperar e se manifesta. Movimentar as mãos pode ser a chave para dizer para o meu corpo esperar. “Tenha calma, não saia de mim”.
Olho pela janela e vejo um amarelo surgindo em meio as folhas pontudas da tamareira que plantei há alguns anos, setembro, sempre setembro trazendo uma novidade e beleza. A tamareira que eu mesma semeei, contemplei a doce fruta, do seu caroço fiz muda, difícil de fazer, insisti. Brotou, plantei e hoje está enorme. Manuseei, plantei sem saber se iria comer, hoje sei que vou, sem me perder, saborear as tâmaras. Não sei se é um legado ou uma herança lembrar da presença e do esforço dos antepassados, plantar presença e poder colher essa presença tão em falta nos dias de hoje.
Yumie Okuyama
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