Uma prancha de surf


A barraca já estava no carro. A prancha iria atravessada, o carro era espaçoso uma Parati modelo antigo, não era surf nem adventure, meio quadrado com a cor de “flicts”.

- Vamos! Pegou o miojo?

- Sim!

- Certo, vamos que a noite vai ser longa, amanhã de manhã estaremos no paraíso!

- Você tem certeza de que essa praia é legal? 

- Não sei, mas pelo mapa aqui é linda e fica no sul da ilha. Camila, um pouco atrapalhada com o guia quatro rodas em uma mão e um mapa da região na outra exclamou, sem calcular muito, “qualquer coisa dormimos no carro”. Ele não hesitou e nem questionou, a empolgação era tamanha que não dava espaço para dúvidas. E assim partiram, de Porto Alegre para Florianópolis nos anos de 2001. Saíram depois do trabalho sentido “brioi”, ou mais conhecida BR101.

Chegaram cansados, seguindo as placas sentido sul da ilha, entraram numa rua qualquer e dormiram o resto da noite no carro mesmo. Acordaram com a leve claridade do dia, uma brisa de praia, cheiro do mar e um sol querendo despontar no horizonte e a certeza de que deu certo. O mar estava ali.  E eles à beira-mar.

- Praia de Armação, é linda! Contemplaram por alguns instantes alongando os músculos e espantando o sono presente nos seus corpos que se evaporava pelo encantamento e beleza dessa grande enseada.

- Murilo, ontem a noite vi uma placa escrita “tubarão de sunga” com um desenho de barraca. Camila disse, na certeza de ser um camping. - Foi na avenida antes de entrarmos nessa rua.

- Certo, vamos voltar e aproveitamos para procurar uma padaria.

Despois de tudo instalado, foram para a praia, descobriram outras, o mar estava lindo, carregavam uma prancha, duas cadeiras e um guarda-sol. Murilo, organizou as coisas pegou a prancha, deu um beijo suave na boca de Camila e correu para o mar. Tudo seria muito tranquilo e confortável se ela amasse tomar banho de sol numa cadeira de praia. Camila começou a sentir o sol quente demais resolveu caminhar para olhar melhor o mar e sentir o vento, relaxar na exuberância da paisagem de uma praia que ficava escondida sem acesso de carros. Parece que, antigamente, os pescadores montavam armadilhas para caçar baleias na praia de Armação e as matavam ali na praia do Matadeiro. Camila começou a sentir-se presa a céu aberto, ela e uma cadeira vazia, passiva. 

No outro ano, foram para a mesma praia, mesmo camping, sem as cadeiras, ela enérgica com a sua prancha de surf, uma Fun 7.6 toda branca com um desenho de tribal no bico, encarou as espumas para continuar vendo e sentindo o mar sob seus pés.


Yumie Okuyama


Reescrito em agosto de 2024 para participar da coletânea leituras à beira-mar.

Leituras à beira-mar lançado na bienal do livro do Rio de Janeiro em junho de 2025.


OKUYAMA-DASILVA, Yumie. Uma prancha de surf. In: Leituras à beira-mar/ Organizaçao Lura Editorial. 1 ed. - São Caetano do Sul - SP: Lura Editorial, 2025. p. 190.

Comentários

  1. Embarquei junto com Camila e Murilo nessa surf trip. Lindo ver você desabrochar nesse novo caminho!
    Guardarei aqui esse autógrafo com carinho junto com nosso desenho indo surfar!! Hahaha

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