Escrivaninha amarela


Quando estou em um lugar sagrado 

peço permissão para entrar

Respeito aos ancestrais de qualquer tempo e espaço

Os guias me guiam nessa direção

me mostram os vários “tepuis”

Onipresentes

Representam a força dessa região

Vou subindo o imenso paredão

Tenho medo de falhar, de fadigar 

até mesmo desaparecer

Penso que não escrevi 

tudo o que desejo escrever

Lygia aparece no meu sonho

me mostra uma longa escrivaninha amarela

mas é o verde (talvez dela) que me acompanha no lavrado nos morros, na Gran Sabana 

Sul da Venezuela

Subo o monte com todo o peso e esforço 

para encontrar de novo o Brasil

E vejo a esperança dos que carregam 

o peso da vida sobre esguias pernas

Esforços ao quadrado 

são reduzidos a metade de chances futuras

A escassez do povo não diminui o sorriso largo

o olhar atento e cuidadoso de quem carrega: o carregador

a carregadora

A ânsia de viver de quem vai e de quem nos acompanha 

começa pelo primeiro passo 

dos tortuosos fascinantes 100 km que percorremos

Os dias passam 

nos distanciando 

ao mesmo tempo nos aproximando

ficamos incomunicáveis

ao mesmo tempo sociáveis

passamos frio, passamos calor

incongruências

A harmonia da natureza nos orienta

O cume nem sempre é um pico

Tepui também significa uma grande mesa

Monte Roraima

Incrível

Beleza

Como Lygia, corajosamente contemplo a incerteza


Yumie Okuyama 


Treino de escrita 21 - Lembrar é honrar as escritoras que vieram antes de nós. Escolha uma escritora e escreva um conto, crônica ou poema em sua homenagem.


Escrito em 15/04/2024 logo depois de ter voltado da expedição Monte Roraima com tantas coisas vividas (vívidas) e sentidas, reflexões internas, sociais e políticas. Sonhos, medos, tantas coisas para serem contadas. Respeito a natureza e respeito as grandes escritoras. Gratidão por ter sonhado com Lygia. Revisado em 28/04/2024.


Publicado em um coletânea da escola de escritoras em 2024 com lançamento na FLIP (Parati) em outubro de 2024.


OKUYAMA-DASILVA, Yumie. Escrivaninha amarela. In: Um teto todo nosso: poesias - V3/Organizaçao de Andreia Santos, Angélica Furtado Masson, Brenda Nickele, et al. - Balneário Gaivota/SC: Escritoras Brasileiras, 2024. p. 33










Comentários

  1. Lindo texto, descreve perfeitamente as percepções dessa grande trilha (também compartilho das suas). Onde clico para curtir várias vezes.

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